quarta-feira, março 29, 2006

Linguagem

"Não, deveras não somos de porcelana", ele se surpreende falando em voz alta no trajeto de volta para casa. Reflete a longa discussão de grandes pensadores na sala de casa, que até as cinco da manhã consumia o conhaque.
Caos, ordem, obssessividade, histeria, medo, sexualidade, controle. Sim, tudo não passa de linguagem...
Então, porque continuar a escrever, se tudo se resume a querer comunicar? E comunicar inclui o fato de querer expor pra si mesmo, de maneira clara, tudo que se sente/pensa?
Um cigarro. Pronto. Pulmões cheios de fumaça pra relaxar um corpo cheio de tremores, e uma mente cheia de conflitos.
Existem perguntas pessoais demais para serem discutidas, conclui. Mas, não há então, nada de absoluto no mundo.
Queria eu saber, como penso que tu gostaria. Mas, além de todas as palavras sobre tempo/espaço/linguagem, algo fala mais alto.
Um linguagem menos clara, mas muito mais forte que qualquer palavra dita ou escrita.
Um linguagem que não depende de paradigmas ou paradoxos. Uma linguagem compreensível enquanto nada mais parece fazer sentido.
E nisso ele agarra-se. E nisso ele concentra-se.
E acalma-se. Pronto, está tranquilo. Tem um longo caminho a percorrer, ainda. E assim, pensa na taça de vinho, no copo de água, e na fome que tem.
E isso, acima de tudo, o lembra de estar vivo. Não que ele tenha esquecido, pois isso seria imperdoável. Seu coração ainda bate, forte e ritmadamente na maior parte do tempo.
E ele decide escrever, não sobre as leves carícias que passaram desapercebidas, ou sobre o que pensava enquanto tudo era dito. Decide, sim, escrever sobre si mesmo.
E pelo menos isso ele pensa que sabe.

E sabendo isso, sabe que deve continuar. Não terminou ainda, pensa. E nada termina sem um fim. E assim, decide nunca mais rabiscar nenhuma foto.

para R. R., com pesar.

Um comentário:

Anônimo disse...

"nao há nada que um homem nao diga, que ele não transpire pelos dedos..."

Freud