quinta-feira, julho 27, 2006

cebola

Vejo tudo ao redor como se estivesse escorrendo.

Lágrima, isso se chama.


Detesto cebolas.

quarta-feira, julho 26, 2006

leve

Transito por entre casas e ruas, que nem sei deonde vem e para onde vão.
Espero que encontre o caminho mais seguro.
Alguns quilometros de distância entre a estabilidade e minha instabilidade comprovam que não fui longe demais.
Meu pensamento nem tem vagado por tão longe. Terras distantes, apenas cinematográficas.
Aquelas referências todas que não consigo afastar começam naturalmente a fazer parte do meu dia-a-dia, e assim não sinto mais dor. Sinto sim a anestesia. Aquela mesma anestesia, sabe como?
E sinto sim, saudade das escassas palavras, e me sinto tolo. E sinto falta.
Mania de possuir manias, esperar que elas passem.
Os olhos embaçados que não consigo limpar com as costas das mãos. Os braços doem, sem massagem.
Os pés andam, cansam, andam, seguem. E o pensamento flutua tão perto que chega a agonizar...
Estou tentando me educar a viver sem estar apaixonado. E qual a vida sem paixões?

A minha. Desde ontem. Será?
É tudo mentira. Preciso ser sincero comigo. Preciso.
Eu sei.



E não importa se sangro, e não importa se sigo, se escuto.
Importa se falo? Se escrevo?
Alguém aí já leu meu pensamento?

Naquele quarto vazio, imagino o cheiro de tinta. Todas as camisas jogadas, todo dinheiro jogado fora, todo tempo desperdiçado.
E todo tempo vivido, e tudo que aspiro e faz sentir bem.

E tudo que espero. Esperar pra quê?
Que falta me faz, que falta me faz.

Me faz. Me faz.
Me fez.

Me fiz.
Forte e fraco. Tusso e respiro. Anseios demais, palavras de menos. Abraços devidos.
Um beijo ao vento, que leve para onde entender.

Me leve, leve. Nem tão solto, mas também livre.

Leve.
Só não posso esquecer das asas, do coração, da língua e do pensamento.
O resto pode ficar para trás.


Inclusive o que sobrar de mim, e as flores que amassei quando tentei continuar com os pés no chão.


(E antes do fim, uma pergunta: em que língua se comunicam os que amam?)

domingo, julho 23, 2006

retalhos

Tem dias em que acordamos e temos várias coisas para fazer. As vezes coisas que não queríamos, e mesmo assim somos obrigados. Mas isso é tão comum.
Apaguei um trecho da minha história das paredes. Tudo que sobrou foi tinta e cheiro de alcool. Todas as palavras dissolvidas pelo solvente orgânico. Líquido contra sólido, sólido no líquido e fim.
Toda a poesia de um dia num pano manchado. E um banheiro limpo, com paredes esterilizadas.
E uma casa perdendo a poesia, e outra casa ganhando mais palavras, música e imagens. Eternos ou não.
Da mesma maneira que constrói, destrói, e tem-se um ciclo. Quase perfeito.
E todos aqueles pedaços que guardamos, sujos ou limpos, temos que reorganizar. Jogar fora, manter, tornar nossos ou de alguém, fazer.
E assim se fazem dias, meses, dois anos.
E assim se fazem textos, poemas e canções. De pedaços perdidos costurados pela linha que determinamos. Uma colcha de retalhos que pode ou não fazer sentido, dependendo de quem a vê... ou de quem ela aquece.

Compare teus dias com isso, entenda o que quero dizer, e me diga: não te incomoda quando tua beleza entra em conflito com a beleza de outros? Não! Não estética. Não. Mas sim a beleza.
Não a simples beleza que se toca com os dedos. Mas aquela que se sente.

Dias sem palavras de conforto, a não ser as de sempre.
Sabe do que falo? Espero que sim.
Que som? Aquele de acordar. Aquele que fazem as palpebras ao piscar. Esse, esse mesmo.
O som do abraço. Aquele que me faz dormir aconchegado.

O som do corpo, quando cai. Som que suponho.

Está na hora de colorir os sonhos em outra vizinhança.
Me empresta tuas cores, das minhas já cansei.

quinta-feira, julho 20, 2006

As vezes penso que não preciso de ninguém além de mim.

Engano.

segunda-feira, julho 17, 2006

Acordei de frente a um rosto conhecido, separado do meu por um vale imenso.
Tudo tomou seu rumo.
Em lençóis alheios, sem beijo e sem sexo. Somente palavras. E elas bastam.

Cortei pedaços de mim mesmo, pedaços indolores, pra aplacar a vontade de me ferir em cicatrizes.
Mudança necessária, novo eu no espelho. Um eu mais eu.

Cortei a paciência, joguei na sarjeta o cigarro pela metade.
Meu cigarro queimou por mim. Além de minha febre, ele queimou por mim.

Senti como se me sugassem de meu pescoço. Senti como se escorresse pelo chão.
Vermelho. Engrossando com o tempo.
Senti engrossar, empastar.
Senti coagular-me.
Senti secar.
Senti formar uma mancha.

E por ali fiquei.

Agora, seco. Provavelmente, até amanhã.
Ou até terminar a cerveja.
Ou até salivar. Ou me salivarem.

Ou até sentir...

Ando denso, demais. Metálico. Mecânico. Menos eu.
Quem sabe passe logo. Penso que sim.
Cheio de semanas passadas, anonimamente declaradas.
Pois é. E são elas, hoje, que me fazem esperar pelas semanas que vem.


"avant ou après la metamorphose?"

sábado, julho 15, 2006

existência

Tem coisas que a gente vê e fazem acordar.
Tem coisas que a gente ouve e fazem viver.

Tem coisas que a gente bebe e fica tudo bem.

Toma uma cerveja comigo hoje, no balcão do bar, e prometo não escorrer pelos dedos.
(pelos meus dedos)

Assim, continua o ciclo de fugas e não-fugas.

E quiçá você esteja aqui.
Pero, creo que no.

Pena. Queria que estivesse. As vezes parece que você não existe.
E existe?
Contradição. Existo demais, pra ti, talvez. Sou supraexistente dentro de mim.
Enquanto você... ah, você... Você talvez só exista porque eu quero. Porque eu penso, lembro.

E eu, existo. E não consigo evitar.

quarta-feira, julho 12, 2006

atmosferas

Adrenalina faz tudo parecer certo, tudo parecer em seu lugar.
Trabalho de doze horas não faz bem, mas nem mal; chego cansado, quero deitar.
Fumo um cigarro pro mundo acabar, e ele se reconstroi durante a ducha quente.
Os olhos estavam quase caindo, se levantam... Vejo as cores, elas todas. Agora ainda mais, meu banheiro tem mais luz, mais branco. Menos mofo nas paredes, menos sujeira nos cantinhos.

Decisões que se tomam sem se ter escolha, paredes que fecham o caminho, paredes a serem puladas, escaladas, arranhadas. Quebro minha unha, sinto minha dor.
Mas é só uma unha. Mesmo depois disso, continuo inteiro, e ando sem cambalear.
Os pulmões que parecem sair pela boca em alta velocidade, a cabeça pressionada. A falta de ar, mas ar pra quê?

Divide comigo tua atmosfera? Obrigado.

Assim me sinto mais um no mundo.
Mas melhor mais um, que menos um.

Se bem que, nesse problema que não é de ninguém, de superpopulação...
Pior superpopulação interna? Quantas habitantes cabem dentro de um coração?

Desse mal, pelo menos, não morro.

terça-feira, julho 11, 2006

Graines d'étoiles

"Pour un peu de toi je pars sans hésitertout au bout du monde sur le toit au sommetMarks your path with scattered seeds beneath the opal starssur ton cheminbut in the crowd there's onlz one beneath the opal starssur ton cheminle long de tes reinsJuste un peu de voix, un souffle pour suggérerte laisser imaginer la chuteJ'ai parsemé j'ai déposé, des graines d'étoiles opalessur ton cheminj'ai parsemé, j'ai déposé, des graines d'étoiles opalessur ton cheminle long de tes reins"

Emilie Simon.

segunda-feira, julho 10, 2006

entre por esta porta agora, e diga que me adora...

(e todas aquelas musicalidades pra evitar um suícidio...)

Seguir andando nesse frio é um desafio delicioso. Estar contra o vento, sentir a pele quase que cortando. E sempre chegar. Bem, nem sempre querendo, mas sempre conseguindo. Ando pensando demais em sangue e fluidos corporais. Todos. Suor, pus, esperma. Ando naturalista.

E menos preocupado.

Talvez seja esse o motivo desse humor que me incomoda e me faz querer permanecer em casa. Eu, o suor, o sangue, o pus.

E talvez, o esperma. Mas só em caso de felicidade instantanea. E isso não me basta.

Uns Versos

Sou sua noite, sou seu quarto
Se você quiser dormir
Eu me despeço
Eu em pedaços
Como um silêncio ao contrário
Enquanto espero
Escrevo uns versos
Depois rasgo

Sou seu fado, sou seu bardo
Se você quiser ouvir
O seu eunuco, o seu soprano
Um seu arauto
Eu sou o sol da sua noite em claro,
Um rádio

Eu sou pelo avesso sua pele
O seu casaco
Se você vai sair
O seu asfalto
Se você vai sair
Eu chovo
Sobre o seu cabelo pelo seu itinerário
Sou eu o seu paradeiro
Em uns versos que eu escrevo
Depois rasgo

chhhhhh...uva.

Sabe quando você senta em uma cadeira, que nem confortável é, e nela pretende ficar até seus ossos encolherem e seus músculos atrofiarem? Assim, sentindo tudo escorrer pelas pernas, pelos dedos, pelos olhos... bem, estou me sentindo quase assim.
Quase, ainda bem.
Tenho me irritado com a mania de manter os olhos fixos em cantos de paredes que nada têm para oferecer. Aqueles cantos vazios. Talvez seja o tempo. Tempo ocioso.
Tenho também me irritado com as idades. Espinhas que me tornam adolescente demais, responsabilidades que adultecem, e pra fechar, uma carência que infantiliza.
Onde estou?

Sinto espalhados meus pedaços, arrastados pela chuva para os bueiros, nesse domingo.
Meio rasgado.

Quem sabe, amanhã, você beba um pedaço de mim depois que eu passar pela central de tratamento de água e esgotos.


Ah, como eu detesto domingos...

segunda-feira, julho 03, 2006

Ipê

Enquanto caminhava pegando o sol no rosto depois de ditada minha liberdade, me sentindo adulto demais pra roupa que usava, pensava no ipê florido que queria para mim. Queria sim, naquele momento, a árvore inteira para mim. Queira ler com a cabeça encostada naquele ipê, e em nenhum outro.
Desisti. Grande demais para roubar, caro demais para pagar. Nunca tinha querido roubar algo vivo, nunca. Geralmente roubam-se corações, olhares, beijos. Nunca fiz isso. Quem sabe devesse.
As árvores da beira-mar não tem dono. Podia me encostar nelas para ler. Seria mais fácil. As músicas que escutava dentro de mim me faziam pensar em coisas nas quais não queria me concentrar. Ter visto pinguins falando em frânces e andando delicadamente em fila indiana amoleceu meu coração. Adoro pinguins. E o primeiro que vi, ao vivo, estava morto. Duro, com a nadadeira apontando para o nada. Nessa mesma beira-mar. Torci os dedos para não encontrar mais nenhum cadáver, e andei a linha reta.
Adoro os onibus. Se fosse para morrer atropelado, seria por um. Cheio, pessoas alheias, não para chocar, mas para servir de exemplo.
Somos frágeis.
Por falar nisso, há quanto tempo eu não me molhava de mim? Quanto tempo sem derrubar uma lágrima? Doeu. Uma apenas, grossa, pastosa, salgada demais. Devia estar saturada. Acumulada. Desceu lentamente pela face, lábio superior, inferior, como que para me lembrar do gosto. Queixo. Peito. Absorvida pela lã. Senti o gosto do mar, mesmo estando sentado a metros de distância. Não chorei pelo pinguim. Nem por mim. Só chorei.
Quem entende? Eu não. Nem por mim, nem de mim.
Folheei as páginas, lendo sim, mas sem pensar. Provavelmente eu vá retornar...
Queria entender mais de pessoas, assim quem sabe entendesse mais de mim. Queria saber ler mais e melhor, assim quem sabe estivesse sempre sabendo. E queria, acima de tudo, não me deparar com coincidencias. Detesto a sensação de que tudo já estava escrito.
Não creio. Em quase nada. Talvez em mim, o suficiente para estar vivo.

Queria também ter meus ouvidos tapados. Queria também saber francês e braile. Queria talvez brincar de cego. Queria talvez estar mais perto. E mais longe. Queria, sim, saber exatamente o que eu quero. Não sei. Você pode dizer?

Queria muito, também, entender o que sinto. Me dói a ignorância interior. Me dói a teimosia em mesmas coisas. Diga pro erro que é hora de acertar. Diga pra mim quanto dá um coração dividido. Diga pra mim que mesmo pensando que nem existo, estou aqui... Diga pra mim que me vê, que me lê, que está comigo. Como na música das Coco, como no poema do Leminski, como na música da Marisa, como no texto do Neruda. Como no ipê roxo florido, colorindo o jardim de inverno.

Pisei nas flores, mesmo estando do outro lado da cerca. Meus pés estalaram com as folhas e flores. Fiz uma poça de sangue roxo no chão. Pisei na flor, pisei na árvore, pisei em mim. Pisei, pisei, pisei.
E cheguei ao mar. E senti a maresia. Talvez quisesse o mar em mim, tamanha é a tempestade. Talvez quisesse fugir a nado dessa ilha, seguindo a sul... ou a norte.


Me faça companhia, estou tendo uma crise de relacionamento com meu amor, comigo. Me faça companhia, preciso de terapia de casal, mesmo que seja comigo mesmo. Me faça companhia, faz frio. Quero um abraço pra dormir direito.


Colorir meus sonhos, de roxo, é mais simples assim. Pelo menos o azul eu já tenho, dentro de mim.
Falta, agora, o vermelho.

domingo, julho 02, 2006

com quantos paulos

paulos, paulos, paulos
quantos paulos são precisos
pra fazer um são paulo?
idades, idades, idades
quanto dá uma alma
dividida por duas cidades?
vez como aquela
só mesmo a primeira
mal cheguei a chorar uma lágrima inteira
largue uma lágrima o primeiro que viu o luar de janeiro
é primeiro de abril.
de paulo leminski, poema do livro "la vie en close"