terça-feira, outubro 31, 2006

Começa a ver as coisas de forma diferente. Quem sabe seja melhor assim, pensa.
Refletir mais sobre é inútil. Tem decisões tomadas, não pretende mudá-las. E todos os dias, quando passa por debaixo dos ipês roxos da praça onde a estátua de bronze chora, parece estar preparando-se para a guerra. A guerra do novo-dia. Continência, coronel.
E cada vez que para e pensa, que calcula, tudo parece tão claro. Quem dera fosse fácil como pensar.
Mas sabe, talvez seja. Talvez seja sim. Talvez só seja preciso ter paciência.
Quantas vezes essa palavra foi escrita aqui?

Só sei que nos ultimos meses, tanta coisa mudou que parece que o mundo saiu do eixo.
Tantas convicções, tantas considerações. Medidas de respeito, consideração, tempo, tudo, tudo saiu do lugar. E parece tomar nova posição. E assim, mudam-se os conceitos, mudam-se as visões.

Os preços do mercado mudaram, as cores nas camisetas mudaram, os cheiros mudaram.
Mudaram as idéias de cidade, os sentimentos pelas pessoas, a visão que tem do que se é quando se vê através dos olhos do que foi.

Positivista, tenta ser. Tenta. Mas é dificil. É mais fácil ver tudo como um copo de cristal prestes a quebrar-se no brinde. Mas não. E se, recolhem-se os cacos.

E, como se termina um texto destes, quando nada do que se diz tem por si só um final?

quarta-feira, outubro 25, 2006

reticências da vida cotidiana

Um suspiro, assim, e o dia acaba de começar. Quando está tudo escurecendo, parece acordar. Desligar e ligar em um momento de vida, pois até agora só passou pela mecânica sensação de resolver. E não viver.
E tem se esforçado, sabe, de verdade. Mas sente-se subitamente envolvido por um cansaço atípico. Sabe, aquele cansaço que parece empurrar o mundo contra os ombros, e te faz querer dormir, e dormir, e dormir... E dormindo, sem descansar, sonhar com coisas que te fazem acordar assustado e querer voltar para o colchão.
E esse ciclo desgasta, entope, vicia. Não pelo bem, mas pelo díficil. Que nem de longe significa pior, porém faz pensar.

Nesses momentos querer saber tudo e ter soluções é inevitável. E essa busca torna tudo mais intrincado.

Vem a pergunta: viver para descobrir ou morrer para aliviar?
Sabe que nem sempre o alivio resolve, e que nem sempre descobrir é agradável.

Librianos do segundo período de vida tendem a ser altamente sociáveis, porém a viver sozinhos.
E solidão, como resolver? Como lidar? Como falar?
Sozinho. E ponto final. E assim tudo reinicia...

Acha que tudo precisa de um barulhinho de chuva e um piano para melhorar.
Acha que tudo precisa de tempo.

E tempo não falta. Sobra. É só saber esperar. E aprender a fazê-lo. E aprender a viver.
E na luz dos vinte anos, saber que se tem muito a ver, sentir, fazer.
E na escuridão dos vinte sabe de tudo que passou.

E na esperança dos muitos, sabe que está começando.
E começos dificeis favorecem. Acredita.


Perverso coração, perdida mente, no bom sentido, perdidamente está.
Bom ou ruim?
Só resta esperar.

sexta-feira, outubro 20, 2006

Semeando astros.

Andava pelas estrelas fitando o chão. Quando decide descer, erra o pulo. Perde-se por momentos dos quais faz questão de lembrar. Aprender. E assim segue. Não sabe dar um passo de cada vez, desce escadas na ponta dos pés e tem um dedo do pé fraturado. Sabe muito bem onde quer chegar, mas não o caminho a seguir.
Com um punhado de estrelas tenta encontrar a constelação correta. Insiste. Relaciona os pontos, tenta entender. Ver do lado de fora, coexistir. E assim tenta, tenta, senta. Descansa e retorna aos passos amontoados. Cada tentativa leva semanas, meses. E ainda erra. Nos mesmos pontos talvez.
Quem dera conseguisse realmente tocar o que tanto tenta alcançar. Mas sabe, parece ser muito mais gostoso ficar tentando.

Até que fatigado, resolve sonhar. E assim, cria sua galáxia, suas constelações, seu planeta.

E a única certeza é que as estrelas ainda estão lá para brilhar. Existindo ou não.
E esse existir, ultimamente, não tem sido o maior dos problemas?

quinta-feira, outubro 19, 2006

Chorei o dia todo... sem querer. Gripe de matar.
Deitar no colchão e dormir, dormir por causa de pílulas baratas e nem sempre tão efetivas.

Esquecer da vida cotidiana por estar de cama. Quantas maneiras melhores de permanecer na cama e esquecer da vida.
E esses retornos confundem a cabeça, fundem. E baixam a imunidade. E esse calor febril me faz sentir saudade do calor do abraço.

Nesse momento, que braços fiquem longes. Sou contagioso.


Essa luz me incomoda.

sexta-feira, outubro 13, 2006

Diálogo com mim mesmo 1

Só sei que sinto muito por sentir, sabe?
Desperdicei um pouco de vinho. Nada demais. Era daqueles vagabundos, de tampa de rosca.

De qualquer forma, uma xícara a menos dentro dessa casa. E só eu sei como pode fazer falta...

Está na hora de tomar um caminho contrário.


Contrário ao que sempre considerei o caminho mais seguro, confortável.
Durma bem.

Estou sem sono.

quinta-feira, outubro 12, 2006

imaginário

Sempre pensei que existisse, e existiu por tão pouco tempo.
Talvez dentro de mim existisse mais que por si só, porém não basta.
Os olhos precisam ver, e as mãos sentir.
E talvez dentro de meses existisse por que eu quis... e querer muitas vezes não basta.
Influenciei alguns atos, influenciei alguns momentos, e foi tudo.
Tudo que sobra de uma existência assim é ausência.

De quê? Não sei. Imaginação de sobra, realidade amena.
E ponto.
Talvez as coisas sigam existindo, existindo. E eu continue imaginando, imaginando.
Influenciando. E talvez um dia exista.

Mas não agora. Agora o que existe é ausência de algo que só há dentro de mim.
E talvez quem leia sinta o mesmo, uma ausência que existe tão forte que parece estar ao lado.

E isso faz sangue correr, faz vida seguir, faz coração bater.
Mais forte.

Já foi. Deixa de existir com a facilidade com que foi criado.
Artificios de uma mente criativa. Uma mente humana.
Uma mente de matéria.

E em menos de quinze minutos se faz um novo dia.
Um novo dia mais realista.
Pelo menos até os olhos abrirem depois de algumas horas de sono.

Um sono não velado.

sexta-feira, outubro 06, 2006

Bem, eu nunca quis ser aquilo que te faria sentir. No significado da palavra: sentir. Sempre soube que sentiria, mais por mim. Sempre. E sempre foi assim. Nunca me neguei isto.
E é claro, sempre soube das consequências de sentir sozinho, e arquei com elas, toda vez que pude. Evidentemente, muitas vezes senti na carne.
É como acordar em dia de chuva, sabe? Sem ter o guarda-chuva xadrez cafona, mas que funciona. É como ver um filme dublado, por mais que seja para adolescentes.
Tá. Já chorei sim. Chorar por homem, pouca vergonha. Disparate. Homem é tudo palhaço!
Me incluo sim.
De qualquer forma, não aprendo. Nem com meus próprios erros. Uma pausa para respirar e fumar, e pronto, esqueci onde tinha parado. Se é de todo mal, nem sei. Mas bom também não é.
Quem sabe seja culpa desses vinte anos. Pouco pra se saber. Ou culpa minha, absoluta mea culpa. Ou de ninguém. Pra que culpar alguém? Nem tudo tem um culpado. Tampouco, sobram inocentes.
Abro o orkut, vejam a ironia:
"Sorte de hoje: O tempo é o senhor da razão"

Paciência, Senhor. É tudo que peço. E sei o quanto custa.
Parcela em seis vezes no cartão? Em meio ano pagando promessa quem sabe eu chegue lá.

Droga. Onibus me tira do sério. Falta de xampu no chuveiro também. Bom é ficar esperando as coisas caírem do céu... dinheiro, emprego, namorado. Tudo cai do céu, pelo que vejo. Preciso de um apartamento com área ao ar livre, pra ver se apanho alguma coisa. Procurar não tem dado resultado algum. Quem sabe eu não esteja enxergando direito. Mas óculos? Me recuso. Cara de bolachão de mel e óculos não combinam.
Sabe aquela bolacha de mel seca enorme que vendia em boteco, num pote ao lado dos corações de abóbora? Essa mesma.

Enquanto escrevo isso tudo, fico enrolando o cabelo que cresce todo errado. Seco. Por mais que eu hidrate. Fazer carinho na própria cabeça. Pronto. Cheguei ao fundo do poço.

Cadê as molas?

quarta-feira, outubro 04, 2006

Datas.

Todos os dias tinha os mesmos ritos: acordar, lavar o rosto, cigarro, café.
Todos os dias olhava pela janela e tentava sentir o tempo... sem sucesso. Sem guarda-chuva.
Todos os dias pensava o quão longe estava. E o quão perto se sentia.
Todos os dias, a mesma pessoa.

Expectativas, sempre. Como esperava! Aprendera a ser paciente, e nunca mais esquecera.
Tão dificil era, e tão doloroso. E submeter-se a tal nunca fora facil.
Mas, de que adiantava? Nunca soube.

Do que sabia, se sempre se surpreendia? Ora, nada. Como qualquer um.
Sabe não é próprio dos humanos.
São tão poucos que sabem algo. Principalmente de si próprios.

Os olhos um dia se abrem. E os dias passam.

E ser criança não é mais datado. É passageiro.
Arrependimentos, poucos tinha.
Culpas, algumas.
Desculpas, milhares.
Orgulhos, poucos.
Vidas, só uma.

Ou duas, talvez. Dependendo de quem avaliava.
Errado.

Acordar uma pessoa diferente por causa de uma data é irreal.
Surreal. Doce ilusão.

Tudo continua igual. Nada é perfeito, mesmo que por pouco.
E ainda se espera.
Sentado.

Deitado.

São apenas números. Sem sentido. Como os do relógio.
São apenas minutos, horas, meses e anos.
Apenas tempo. E quem sabe sobre o tempo?

Pior que perder-se no espaço é perder-se no tempo.
De si mesmo.

domingo, outubro 01, 2006

Pérolas

Acorda sozinha. Pra quê esse barulho chato de despertador se faz tanto tempo que acorda sozinha?
Desce em passos firmes e automáticos uma escada que sabe de cor. Todas as rachaduras.
Esquenta a água em bocejos. Escuta os passos que conhece há mais de trinta anos.
Escuta aquela voz que reconhece há mais de 40 anos. E agora ela pede por café, não por carinho ou atenção.
Pó escuro no tecido claro, água quente e vapor sobre o pó. Um cheiro inunda a casa e tapa seus ouvidos para os pedidos do corpo que ela mais conhece. Acompanha o vapor, saindo pela janela e misturando-se ao ar gelado desta manhã.
Deixa o pó e a água. Deixa o vapor. Faz o caminho contrário deste, que sai. Entra cada vez mais dentro do lugar que chama de casa, lar.
Sobe os degraus sem ver as rachaduras e os ácaros do tapete.

Senta-se na cama, na colcha, presente de casamento. Hoje é um dia para bem vestir-se.
Escolhe o vestido mais bonito. Aquele verde, que quem sabe ainda sirva.
Um vestido de festa, que dia feliz!
Percebe um rasgo, talvez do tempo, talvez de calcanhares. Decide consertar o que um dia foi estragado.
A caixa de costura de madrepérola sobre o colo, linha na agulha.
Enquanto une os dois lados do cetim, sem se preocupar o quão perceptivel será o reparo, une o que foi e o que é. Sendo que, o que foi não será nunca mais.
Tantos anos, tantos anos assim, como esse vestido.
E agora, até ele está gasto.

A cada ponto, um ponto. Suas conclusões a assustariam, caso fosse mais jovem. Hoje ela sabe.

Delicadamente, tira os pijamas. Se vê nua no espelho. Toca a pele, sente o toque. Ainda mantém a forma, e nunca tivera medo de perdê-la. Medo de envelhecer. Agora, tem medo de nunca ter sido jovem.
Veste o vestido, como quem quer ser novamente o que um dia era. Calça os sapatos de festa, o única par que resta. Cuidadosamente coloca pérolas na orelha, no pescoço. Elas pesam como nunca.
Desce as escadas com a chave do carro nas mãos. Ignora as palavras que ecoam da cozinha pela casa toda.
"Posso mesmo ter enlouquecido."
Senta-se no carro. Ignição. Fixa os olhos. Detesta dirigir, mas o faz bem. E faz bem. E hoje, particularmente hoje, tem prazer nisso.
Segue o caminho que mais machuca. Acelera, ofega. Ansiosa, dirige sem o cuidado que teria.
Com os pés na areia, a mesma areia que conheceu sem saber. Tantos anos atrás, essa praia foi sua casa, sua vida, seus olhos.
Olhos agora molhados.
O rochedo onde via as estrelas, luas, nuvens e sonhos agora serve como lugar para descansar. Deixa as ondas acalmarem o coração. Deixa o vento acariciar os cabelos e levar todos os pensamentos além. Sente o cheiro de maresia e nostalgia. Sente a essencia do paradeiro. Sente a pele renovada. Sente-se jovem novamente.
E não suporta as mentiras da vida.

Arranca as pérolas da orelha. Devolve ao mar.
Arrebenta o colar do pescoço, vê o brilho rolar.

Segue os grãos de areia envoltos.

Sempre tivera vontade de voar, e hoje voa, pela primeira e ultima vez.
Sempre quisera o mar, e hoje ele é dela.
Sempre amara viver, e ainda ama.

Mas tudo tem hora para acabar.
E ela soube esperar pelo momento exato.

E nunca teve tanta certeza.
Com os pulmões cheios de sal, sente o gosto doce de quem foi até o fim.



fim.


(discos quebrados pra ver se você vem)